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quarta-feira, 19 de maio de 2010

A supremacia da visão

Diga-me leitor, se for pedido a você que descreva um lugar qualquer, como você o faria? Suponhamos a sua casa (e aqui estarei relatando sobre uma casa fictícia). Você diria: "é uma casa grande, espaçosa, com 3 cômodos para dormir, 3 banheiros uma sala de estar, um escritório, um lavabo e uma cozinha. As paredes da sala são cor de oliva, bem como as do cômodos e as do escritório. Os demais locais possuem azulejos nas parede. Temos muitos móveis da época vitoriana e alguns quadros de arte moderna. Ademais temos uma pequena biblioteca no escritório, um forno de 6 bocas na cozinha, etc." E assim a descrição continuaria até que cada minúncia tenha sido analisada. Mas será mesmo que foi?

Espero que já tenha percebido leitor, que toda a informação que precisou para me descrever tal local obteve com o sentido da visão. E é exatamente isso que estou abordando nesse post. Nós temos o hábito de nos valer da visão como a forma mais segura e concreta de se abstrair o mundo. Mas o que lhe impediu de, ao invés de me dizer a cor da sua parede, não me dizer qual era sua textura? "Ligeiramente áspera" você poderia me dizer. E o que me diz de descrever sua cozinha como "um local em que sempre pela manhã se sente o cheiro de pão fresquinho, pelo dia o de almoço caprichado e pela noite o de uma janta saborosa"? Poderia me dizer que, ao acordar, é possível ouvir do seu quarto o som dos pássaros cantando e que pela noite é inevitável ouvir o som da madeira rangendo. Talvez o paladar se limite nessa minha abordagem dos sentidos, mas você poderia utilizá-lo para descrever o gosto que tem a água que passa pelo velho bebedouro de argila que vocês possuem, ou a aquela que você bebe da torneira.

Mas espero que você perceba que o mundo é bem mais vasto do que somente um sentido pode nos dizer. A visão de fato é algo magnífico e encantador, mas ela não é superior a nossos outros sentidos de forma alguma, pois cada um deles é uma forma de se compreender o mundo, e o único motivo pelo qual a visão deve ter se sobreposto aos outros é o fato dela ser mais impessoal. Certamente todos compreendem quando alguém se remete a um círculo, ou a algo de cor vermelha, mas tentem ver se há a mesma concordância entre essas pessoas quando se trata de um "perfume adocicado" ou de um "som suave". É complicado tentarmos compartilhar nossas experiências pelos outros sentidos, porque elas trazem consigo mais subjetividade.

O que não quer dizer que não valha a pena fazê-lo. Assim como a visão nos propicia um amplo campo de compreensão do mundo, certamente os outros sentidos podem nos propiciar também. Basta tentarmos o esforço. Basta ao invés de admirar a beleza de uma flor pela suas pétalas, admirá-la pelo seu aroma, ao invés de gostar de maçãs por estarem bem vermelhas, gostar por serem bem suculentas, ao invés de elogiar seu cachorro pela sua beleza, elogiá-lo pelo toque macio de seus pêlos ou por suas lambidas amigáveis, ao invés de apreciar uma cachoeira por sua grandeza, apreciá-la pelo poderoso som que a água produz ao cair de grandes altitudes, revelando sua marcante presença.

O mundo não é só o que nossos olhos podem ver, e certamente vale a pena descobrir o que há além disso.

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